O Tempo na Moda
“O homem
domesticou o tempo ao criar o relógio de pulso”
Baudrillard
Com os
desfiiles das coleções de inverno em São Paulo e no Rio temos um assunto em
maior evidência para se comentar – a Moda. Existem muito cronistas de Moda mas
poucos críticos e pensadores sobre ela. Baudrillard em seu
livro “Sistema dos Objetos” cita alguma coisa sobre um ponto de vista da semiótica, assim como
Lipovetsky em “O Império do Efêmero” que se debruça sob seus aspectos
sócio-culturais.
Nestas semanas
de moda, acompanhando os desfiles, senti pouco interesse estético. Praticamente
todas as coleções não apresentaram nada de realmente novo. O que vem existindo
é um pastiche, uma suplementação, uma recorrência de estilos passados que na
maioria das vezes dá lugar ao caos. É o “going back to go to the future”
(voltar ao passado para se chegar ao futuro). E o que é engraçado ou triste é
o fato dos comentaristas na TV não apresentarem nenhum discurso interessante.
Eles apenas descrevem o que já estamos vendo – que a saia é mini, que tem
babados, que tem recortes ou brilhos enfim pouca cultura ou conceitos
veiculados. Claro que existem trabalhos de estilistas muito válidos, mas
poucos...
Mas não é sobre
os desfiles e as últimas coleções o que quero escrever. Como a moda é o espelho
da sociedade e estudá-la e tentar compreendê-la irá contribuir para a
compreensão de nós mesmos, pensei em abordar um assunto que acho bastante
interessante - o tempo. Como ele é sentido por nós na sua
irreversibilidade, desde nosso nascimento até a nossa morte e como ele é
representado e apreendido na moda nos últimos tempos.
Sim, porque
falar sobre o tempo é algo muito complexo e extenso que pode ter um viés
científico ou filosófico, mas não pretendo fazê-lo desse jeito. Quero escrever
sobre os relógios de pulso que, notadamente, nas últimas coleções européias vem
tomando grande destaque dentre os acessórios femininos.
Até uma década
atrás aproximadamente era prerrogativa masculina o uso de relógios grandes. Entretanto com
o passar do tempo e o crescente poder das mulheres nos vários ramos
profissionais, este item passou a possuir não somente sua função denotativa
objetiva mas suas funções conotativas como signos estatutários e ostentatórios
adquiriram relevância qualificando seu usuário de determinada posição na
pirâmide social ou cultural.
Assim a grife
do relógio torna-se tão ou mais importante do que saber que horas são, uma vez
que o saber das horas pode ser conhecido de inúmeras outras formas como no
celular, no carro, em pontos públicos etc..
Existe uma
concorrência acirrada entre as grifes tradicionais das grandes joalherias
tradicionais como por exemplo Rolex, Boucheron, Movado, Cartier, Patek Philippe
e a das grifes de moda como Coach, Dolce e Gabbana, Gucci, Hermès, Fendi, Dior,
Versace entre outros.
Anderson Cooper |
Relógio Fendi |
Em 2005 a Fendi
lança tendência com um super relógio 4X4 cm e no editorial da Vogue americana
do mês de de novembro de 2005 uma super modelo posa com um super relógio; algo
super inusitado! Mas ainda é lançamento. Poucas usam ou ousam.
Reetrocedendo oum pouco no tempo, em 2004 começa a
tendência dos super anéis, os chamados anéis de coquetel, do tamanho do anular,
feitos com citrino, diferentes típos de quartzo e diamantes.
Anéis de cocktail |
Em 2008/9 os
acessórios ficam cada vez maiores; brincos, pulseiras, colares tornam-se
gigantescos, brilhantes, pesados, massudos. Na minha opinião pouco ergonômicos
porque possuem pontas agudas que podem perfurar a pele, as roupas, embaraçar os
cabelos. São muito pesados porque são feitos de gemas verdadeiras e não
plastificados.
Super colar |
Quem irá
usá-los? Sem falar que são esteticamente bastante grosseiros. Essa tendência já
chegou até o Brasil em algumas lojas de bijoux sofisticadas mas apresentam os
mesmos resultados desanimadores.
Na corrente do
gigantismo estão os chamados relógios poderosos ou como chamam os americanos
“power watches”. Surgiram para reforçar o poder as mulheres profissionais, se é
que as verdadeiras precisam deste recurso…
Passendo por aí
vi inúmeros pulsos de brasileiras adornados por relógios douradíssimos,
exageradamente grandes, com corrente metálica, estilo Rolex masculino, todos
praticamente iguais à primeira vista. Com grifes indefiníveis. Num primeiro
olhar, conotando prestígio, aristocracia e “ócio”. Sem dúvida objetos
cuja ênfase é dada à aparência e ao “poder”.
Rolex de ouro e brilhantes |
Entretanto
percebe-se aí uma grande contradição de uso. Estas consumidoras buscando
uma identidade ou personalização através do uso de uma grife (de difícil
visualização), do simulacro do ouro (dourado) e do poder (tamanho gigante),
acabam por despersonalizar-se e seu objeto de desejo acaba por perder-se na extensa
malha dos objetos de menor taxa de originalidade, dos objetos erzats ou objetos
simulacros, na massificação dos gostos, na generalização e nivelação dos atos e
opiniões.
A moda é uma
grande impostora, criadora de ilusões. Ela tem uma rapidez tanto de produção
como de consumo próprias. O consumidor está sempre ávido por novidades e ambos
se auto alimentam criando o objeto supérfluo, com sua obsolescência programada.
Neste ciclo o usuário então sente-se fora de moda, inadequado e com medo da
rejeição, pronto para um novo "novo" que já está sendo novamente lançado…
Desta vez o
novo é a volta ao velho, ao passado, ao retrô, ao “vintage”. Novos editoriais
de moda em 2009 nos mostram relógios pequenos ou médios, bem femininos,
com correias finas e delicadas trabalhadas seja em couro, douradas ou em ouro…
A moda dá voltas |
Relógio tamanho médio |
Relógio estilo retrô ou "vintage" da vovó |
Assim cria-se
uma congestão de produtos inútes onde o “mais consumo” ainda é considerado “bem
estar” mas que nada tem a ver com responsabiilidade ambiental e sustentabilidade.
Milhares de grifes de relógios continuam a perpetrar diferentes estilos e
modelos cada ano com pequenas alterações em tamanhos criando assim novas
“necessidades” alienadas da questão planetária.
Atualmente comenta-se que as pessas estão desistindo de usar relógios um função das novas tecnologias - o uso constante dos Smartphones, Pads e outros. Mas há quem ainda o considere importante elemento de estilo e status. Pessoalmente acho relógios de pulso mais práticos do que ficar abrindo o celular, além do prazer estético de cada moldelo.
Como disse
Baudrillard, “o homem já conseguiu domesticar o tempo pela criação do relógio
de pulso”. Pergunto eu, conseguirá ele “domesticar” seus critérios éticos,
tecnológicos e culturais?
É o que se
espera urgentemente agora.
Suzana M.
Sacchi Padovano
Créditos:
Foto Mr A.
Cooper /Hillary Walsh
Demais fotos:
Revistas Vogue America 2004/2005/2008
Elle America
2008
Fevereiro 6, 2009
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